Cobrança de valores indevidos: entenda o seu direito como consumidor

A fim de reduzir a inadimplência e, até mesmo, facilitar a retribuição financeira de um serviço prestado, muitas empresas acabam por oferecer aos seus clientes a opção de pagamento mediante débito automático. Ocorre que tal método necessita de atenção redobrada, isso porque são grandes as chances das pessoas se depararem com a cobrança de valores indevidos. 

A título de exemplificação, supõe-se que uma pessoa contrata um serviço de TV por assinatura por um valor mensal acordado entre as partes, pagos mediante débito no cartão de crédito, e, porventura, começa a ser cobrada em duplicidade. Nessa hipótese, o consumidor, em tese, possui o direito de receber a restituição em dobro de todos os valores cobrados indevidamente, conforme prevê o Código de Defesa do Consumidor, Vejamos: 

Art. 42. Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça.

Parágrafo único. O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável.

Nesse sentido, como bem ressaltado pelo dispositivo transcrito acima, a restituição em dobro apenas irá ocorrer quando os seguintes requisitos estiverem preenchidos: “(i) a existência de uma relação de consumo; (ii) a ocorrência de uma cobrança indevida; (iii) o pagamento pelo consumidor do valor indevido; e (iv) ausência de engano justificável por parte do fornecedor” .

Vale dizer, em caso de “engano justificável”, caberá apenas a devolução simples dos valores indevidamente cobrados.
 
Todavia, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça orienta que o ressarcimento em dobro apenas ocorrerá quando o valor indevidamente cobrado estiver acompanhado de MÁ-FÉ, ABUSO OU LEVIANDADE, nos termos do art. 940, Código Civil, o qual prevê que “aquele que demandar por dívida já paga, no todo ou em parte, sem ressalvar as quantias recebidas ou pedir mais do que for devido, ficará obrigado a pagar ao devedor, no primeiro caso, o dobro do que houver cobrado e, no segundo, o equivalente do que dele exigir, salvo se houver prescrição”.

Oportuno ressaltar que não são todos os que concordam com tal posicionamento do STJ, principalmente no que diz respeito à relação consumerista, considerando que o requisito da comprovação da má-fé não consta no art. 42, parágrafo único, do CDC, nem em qualquer outro dispositivo da legislação consumerista. 

Sendo assim, o STJ decidiu, em julgamento de Recurso Especial, de relatoria do Ministro Herman Benjamin, em síntese, que incluir o pressuposto da má-fé, em casos de RELAÇÕES CONSUMERISTAS, reduziria a proteção do consumidor, que é a parte vulnerável de toda e qualquer relação de consumo. Desta feita, a decisão fixou a seguinte tese: 

A REPETIÇÃO EM DOBRO, PREVISTA NO PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 42 DO CDC, É CABÍVEL QUANDO A COBRANÇA INDEVIDA CONSUBSTANCIAR CONDUTA CONTRÁRIA À BOA-FÉ OBJETIVA, OU SEJA, DEVE OCORRER INDEPENDENTEMENTE DA NATUREZA DO ELEMENTO VOLITIVO. 
 
Portanto, caso o cliente tenha sido indevidamente cobrado, ele possui o direito de solicitar a devolução em dobro de tal quantia diretamente ao fornecedor. Não obstante, na hipótese de recusa por parte deste, o consumidor poderá recorrer ao Judiciário e comprovar tal conduta contrária à boa-fé objetiva.
 
Nathalia Mie Fujii é estudante de Direito da Universidade Estadual de Londrina (UEL) e estagiária no Escritório Batistute Advogados.

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